O grupo vai abrir lojas, inaugurar um programa de fidelidade chamado Clube BK e está investindo em algoritmos para sugerir combos aos clientes. O CEO, Iuri Miranda, conta os detalhes ao NeoFeed
Quando o Burger King desembarcou oficialmente com lojas próprias no Brasil, em 2011, num processo liderado por Iuri Miranda, a rede americana ainda tinha pouca presença no País, com pouco menos de 100 franquias locais.
De lá para cá, a operação ganhou corpo. Em 2017, a empresa abriu capital, levantando R$ 2,2 bilhões em sua oferta, e, um ano depois, trouxe para o País a marca Popeyes. Hoje, somando as duas bandeiras, o grupo tem 900 lojas e um valor de mercado de R$ 2,68 bilhões.
Para seguir ampliando esses números, a companhia tem uma série de projetos no forno. Muitas dessas iniciativas, começaram a ser preparadas ainda em 2020 e são o destino dos R$ 510 milhões captados pelo grupo em um follow on realizado em novembro de 2020.
“A maior parte dos recursos será para a expansão dos restaurantes. Outra ponta será em transformação e tecnologia, e uma parcela menor, para a reforma de restaurantes do Burger King”, diz Miranda, em entrevista ao Neofeed.
Na frente de expansão, as aberturas serão centradas em lojas de rua, no Burger King, e em unidades em shopping centers, no caso do Popeyes, com o plano de chegar a um volume próximo de 100 novos restaurantes.
Outro ingrediente de destaque nessa receita é o aplicativo próprio. Aqui, a próxima grande novidade chega ao mercado neste mês, com o lançamento do Clube BK, programa de fidelidade do Burger King, no qual os consumidores mais fiéis da marca poderão acumular pontos e trocá-los por produtos da rede.
Há outras frentes sendo tocadas a partir de tecnologia e das análises dos hábitos dos consumidores das duas bandeiras. Em uma delas, o grupo está testando o uso de inteligência artificial nos POS das lojas para sugerir combos aos clientes.
Essas e outras iniciativas estão em curso após um ano desafiador para o Burger King Brasil que, com os desdobramentos da Covid-19, viu seus resultados serem impactados.
De janeiro a setembro, a empresa reportou um prejuízo de R$ 348,3 milhões e um recuo de 29,1% na receita líquida, para R$ 1,46 bilhão. Na B3, suas ações acumularam uma queda de cerca de 36% no ano.
Em entrevista ao NeoFeed, Miranda dá mais detalhes sobre os passos do grupo para reverter esse contexto. Confira:
O Brasil vive uma segunda onda da Covid-19 aliada a questões como as incertezas sobre o plano de vacinação, o fim do auxílio emergencial e se fala mesmo em impeachment. O que você espera de 2021?
Vejo um cenário melhor do que 2020. No início da pandemia, você não sabia exatamente por quanto tempo duraria e a quais restrições estaria sujeito. Essa volatilidade era, inclusive, diária. Chegamos a ter cidades onde os restaurantes amanheciam com isolamento completo, às 10h vinha uma decisão municipal permitindo a abertura e quando chegava no fim do dia, mudava novamente. Então, foi necessária uma adaptação muito grande. Olhando pra frente, sim, vemos uma segunda onda, mas são medidas de isolamento e horizontes diferentes. Em outros países, já é possível identificar uma correlação entre pessoas vacinadas e redução no número de novos contaminados. No ano passado, não se tinha essa visibilidade. A tendência é ter índices menores de isolamento e, com isso, uma recuperação muito mais rápida. Especialmente no nosso setor, de alimentação com conveniência, que é bastante resiliente e tem um tíquete mais competitivo.
A partir dessas projeções, quais são os pilares da Burger King Brasil para o ano e o destino dos R$ 510 milhões captados no follow on de novembro?
O foco é a recuperação e o retorno do crescimento, e um avanço na captura de benefícios de todo o investimento digital que fizemos. A maior parte dos recursos será para a expansão dos restaurantes. Outra ponta será em transformação e tecnologia, e uma parcela menor, para a reforma de restaurantes do Burger King que já têm mais de sete, oito anos de operação, nos quais fazemos uma atualização de layout e embarcamos avanços como totens de autoatendimento e áreas exclusivas para a entrega dos pedidos de delivery.
Antes da crise, vocês mantinham uma média anual de 100 novas lojas. Na divulgação dos resultados do terceiro trimestre, você projetava fechar 2020 com um saldo de 20 a 25 aberturas. Qual é a projeção para esse ano?
Não será nesse volume, mas algo próximo. No Burger King, 90% serão lojas de rua, pois já estamos presentes na maioria dos shoppings e já temos um bom conhecimento de marca, o que é essencial para se pensar em um negócio de rua. E esse foi um processo que iniciamos já em 2020, com identificação dos pontos, assinaturas de contratos e locação, e sites que já estão em processo de obtenção de licença para construção.
Alguma cidade ou região será priorizada nessa expansão?
Nossos consumidores são mais jovens, das classes A, B e C1. Compramos dados de mais de 5 mil cidades brasileiras e conseguimos saber exatamente quanto de alimentação fora do lar e que perfil de consumidor tem naquela área. Estamos nos concentrando mais no Sudeste, mas temos planos para todas as demais regiões.
No Burger King, 90% da expansão envolverá lojas de rua
E quanto aos planos e critérios de expansão da Popeyes?
Em dois anos, já chegamos a 43 restaurantes. Nossa estratégia inicial foi concentrada em São Paulo e em shoppings. E vamos seguir nessa abordagem, mas agora abrindo para outras praças, com foco, em 2021, no Rio de Janeiro, onde vamos abrir nosso primeiro restaurante nesse mês. O plano é começar a criar o conhecimento da marca por lá e, até o fim do ano, não descartamos outras capitais, possivelmente no Sudeste.
Em 2020, vocês converteram uma das lojas físicas em um projeto-piloto de ghost kitchen, a primeira do grupo em todo o mundo. Como tem sido o retorno dessa iniciativa? Há planos de expansão desse formato?
Hoje, nós fazemos um delivery, em média, de 28 a 30 minutos, do pedido à entrega. Mas nosso sonho é baixar bastante esse tempo. Essa foi a ideia por trás do projeto. São poucos meses de operação e, logicamente, existem ajustes no processo antes de começar a ganhar o tempo que estamos buscando. Ainda não temos um plano de expansão, mas algo que já validamos é o fato de que uma ghost kitchen não precisa estar necessariamente em uma via de alto fluxo. Você pode ter uma cozinha em lugar onde o custo de ocupação seja bem mais acessível e isso já ajuda no retorno do capital que você entrega.
Esse projeto também se conecta o aplicativo próprio do Burger King. Como tem sido a evolução dessa frente?
O aplicativo próprio tem 25 milhões de downloads, mais de 7 milhões de cadastros completos e estamos ganhando cada vez mais funcionalidades. Hoje, por exemplo, é possível fazer um pedido, escolher a loja para retirar e ainda pagar pelo aplicativo. A ideia é eliminar todos os atritos nesse processo. Também lançamos nosso delivery próprio. Atualmente, mais de 60% das nossas lojas já oferecem entregas. Em relação a 2019, essa modalidade cresceu cerca de três vezes. É uma maneira de trazer um cliente incremental, que não está na base de dados dos agregadores parceiros – iFood, Rappi, Uber Eats, James Delivery e 99Food, que usamos.
Ter um aplicativo próprio dá acesso direto ao consumidor e aos seus hábitos, o que não acontece quando o delivery é feito via terceiros. O que vocês estão planejando a partir dessa base?
Na verdade, nós começamos a investir em uma plataforma de CRM em 2019 e concluímos esse processo em 2020, com o rollout para todos os restaurantes. É um projeto importantíssimo, porque o cliente cada vez mais quer ser entendido e tratado como “o” cliente, não como todo mundo. E o CRM tem um papel muito importante nisso, além de ajudar a maximizar a nossa margem. Porque há pessoas que são mais suscetíveis a um tipo de estratégia de preço e você só consegue diferenciar isso quando entende qual é o hábito de consumo do seu cliente. Nesse mês, vamos dar o segundo passo dessa estratégia com o lançamento do nosso programa de fidelidade, o Clube BK, onde os clientes mais frequentes vão poder acumular pontos e trocar por produtos no Burger King.
Como esse projeto se encaixa na estratégia da rede?
Esse é o próximo grande avanço do aplicativo. E você só consegue fazer isso se conhece esse seu consumidor recorrente. Quando a venda é por meio de terceiros, você não tem essa identificação. Cada um dos nossos 900 restaurantes é como se fosse uma fábrica e, também, uma loja que entrega ao consumidor final. Os agregadores não produzem o Whopper, o The Sandwich. É algo que só nós temos e podemos oferecer. Um agregador pode fazer promoção com o Burger King ou o Popeyes, mas é algo muito geral. Nós podemos fazer uma coisa bem específica para cada cliente.
As trocas serão restritas ao universo do Burger King ou há planos de dar acesso a produtos e serviços de parceiros nesse programa? E existe algum projeto de uma iniciativa semelhante para o Popeyes?
Esse é um plano mais para o médio prazo, mas que já passa pela nossa cabeça. É algo que naturalmente pode avançar para parcerias com outras empresas e pelo intercâmbio de produtos no nosso programa. Você abre um universo bastante amplo quando conhece o cliente e ele tem algum benefício. E no caso do Popeyes quando houver escala, fará sentido ter as mesmas ofertas que o Burger King. É uma questão de tempo.
Há outras novas iniciativas envolvendo o CRM?
Começamos a testar o uso de inteligência artificial nos nossos POS. Quando nosso funcionário digita um pedido, um algoritmo, com base no que aquele consumidor está comprando, vê a correlação com outras pessoas que consomem o mesmo produto e o que mais elas compram. E, sugere essa combinação na tela do caixa. Nós avançamos muito em transformação digital. Uma das coisas que fizemos foi reunir o time de tecnologia com a área de marketing e de vendas debaixo de uma diretoria. E, hoje, a tecnologia exerce um papel fundamental na interface com o consumidor, mas também na busca por produtividade.
Quais projetos vocês estão tocando nessa segunda vertente?
Temos mais de 16 mil funcionários. Nós criamos um bot, um número de WhatsApp, que, com curadoria, vai aprendendo e respondendo as dúvidas desse time. Já recebemos cerca de 34 mil perguntas por mês, com um grau de eficiência na resposta superior a 90%. Outro exemplo é o recrutamento. Nosso processo levava mais de 40 dias, desde entrevistar, receber documentos, aprovações, exames médicos, etc. Hoje, todo esse processo também é feito por meio de um bot. Reduzimos o prazo para menos da metade. É uma amostra de que a tecnologia não está só na ponta do consumidor.
O programa de fidelidade é o próximo grande avanço do nosso aplicativo próprio
O Burger King também vem investindo em opções mais saudáveis no cardápio. Um exemplo foi o Rebel Whopper, hambúrguer vegetal criado com a Marfrig. Mais recentemente, vocês lançaram um Whopper sem conservantes e aromatizantes artificiais. Qual é a importância dessa frente na estratégia do grupo?
Esse é um dos pilares que aceleraram muito nos últimos meses. Hoje, 70% do nosso menu já não tem nenhum corante, conservante ou produto artificial e o plano é chegar a 100% do cardápio até o fim do ano. Essa área de produtos “flexitarianos” nos permite servir mais pessoas e vai começar a ganhar cada vez mais espaço, com novidades não apenas para o Burger King, mas também no Popeyes.
As ações do grupo acumulam uma queda de quase 40% nos últimos 12 meses. Com todos esses projetos em curso, quando o Burger King Brasil voltará a despertar o apetite dos investidores?
Até 2019, a companhia vinha em um crescimento pós-IPO bastante interessante, seguindo o plano que apresentamos e fazendo exatamente o que tínhamos planejado. E os investidores enxergam o potencial que temos pela frente. Tanto isso é verdade que, em plena Covid-19, fizemos mais uma captação. Essa crise é uma coisa passageira e eu realmente acho que quando ela terminar, estaremos mais fortes e voltaremos ao nosso ritmo pré-pandemia.